quinta-feira, 2 de maio de 2013

O oculto no que se expõe


Fui hoje ver à Fundação Calouste Gulbenkian a exposição sobre Clarice Lispector.
Que pode dizer quem dedica um blog, como é este, à sua escrita e à de sua irmã, Elisa? Que tudo quanto possa contribuir para a divulgação da obra de ambas é meritório. No caso apenas para a obra da primeira.
Há, porém, um senão que se compreende na sua integralidade seguindo as redes sociais. É que de um pensamento profundo, uma escrita densa, um ser complexo, estão disseminar-se pelo espaço da net frases citáveis. Frases lindinhas, tristinhas, poéticas, mas frases. 
Claro que algumas contêm ideias, interessantes, sensíveis e originais. Mas são frases, excertos, rasgões ao tecido onde se encontrava, arrancadas aos locais onde faziam sentido e porque só aí tinham sentido.
No mundo do corta e cola é o que há, toma-se a parte pelo todo. É a superficialidade feita mostra.
E a exposição que eu vi hoje é essencialmente isso, mais um vídeo já muito difundido no youtube, o da sua última entrevista para TV.
Compreendo que uma exposição sobre uma escritora não é um tratado de Literatura. Mas não deve ser tão pouco.
Sublinho o interessantíssimo design de que as imensas paredes em gavetas são símbolo. Quadra, como metáfora, ao seu tipo de escrita. Permite, abrindo uma ou outra, das que se podem abrir, surpreender o enigma de um documento, um excerto de carta, fotografias. A penumbra e a ténue luminosidade faz um certo ambiente.
O essencial falta, porém. Quem compreende, por exemplo, a barata esmagada que, na sua repelência, ganha prevalência como uma das imagens do conjunto, ou o ovo, acantonado e quase impercepítvel, a menção a plantas a animais? Quem surpreende nisso a teologia herética de Spinoza? Quem descortina o oculto e o sagrado, a cosmologia fracturante em que assenta a sua filosofia? Quem entende no ínfimo o infinito?
O que se esconde quando se exibe? O que se perde quando se cita com o limite do fim de citação?